segunda-feira, dezembro 27, 2004

SOBRE BANDAS SONORAS

Também conhecidas por Original Sound Tracks.

Se há CD’s que me dão prazer comprar, são os de bandas sonoras. Sou capaz de gastar rios de dinheiro nessas coisas (e em livros também). O último que comprei foi no início de Dezembro e foi a banda sonora do “Alexandre o Grande” que, ao contrário do filme, até é bastante agradável.

No entanto, andam por aí umas amibas cujo o único prazer que têm na vida, é estragar os pequenos prazeres da vida dos outros. Senão, porque haveriam estas criaturas de transformar estes trabalhos musicais, produzidos com o único objectivo de dar ambiente aos filmes, em músicas de pseudo-intervenção?...

Pois é estou a falar das escolhas musicais das campanhas do PS e do PSD. Gladiador versus Alexandre o Grande... Mas estão a gozar com a malta ou quê?? Então, o pessoal gasta dinheiro a comprar CD’s para ouvir em casa e depois vêm estes marmelos e usam estas músicas em campanhas eleitorais? Mas que porcaria é esta? E ainda resta saber se têm autorização para o fazer, já que estes trabalhos têm direitos de autor. Se querem música, contratem um compositor que lhes crie um tema épico e arranjem alguma coisa original, não usem os trabalhos dos outros para fins que não têm nada a ver com o objectivo para o qual foram criados.

Já quando foi da campanha eleitoral do «tio» Guterres, o pessoal teve que gramar com a música do “1492” do Vangelis a torto e a direito, mas ao menos teve a decência de escolher uma temática do século XV. Agora estes dois tontos, que mais parecem os dois velhos dos marretas, foram escolher temáticas relacionadas com a antiguidade clássica, quer dizer, só podem estar a brincar! Ainda por cima estamos a andar para trás!

Mas se fosse somente o facto de estarmos a regredir na cronologia, pronto tudo bem, uma pessoa fechava os olhos, tapava os ouvidos e fazia de conta que não estava a acontecer nada. Mas não... A situação é muito pior do que isso. É que um, pensa que é o General Maximus. E o outro pensa que é o Alexandre. Sendo que é mais fácil simpatizar com a personagem do general romano, principalmente por causa do seu percurso de vida, do que simpatizar com a personagem do Alexandre, cuja primeira ideia que vem à cabeça é que aquilo era uma bichanice pegada.

«Portantos», afinal esta história dos épicos tem muita mais coisas que se lhe diga, do que pensar que o simples facto de escolher uma música do Vangelis garante uma vitória nas eleições. Mas para compreender melhor aquilo que estou a tentar dizer, vamos analisar esta história das bandas sonoras por partes.

Comecemos então pelo ‘Gladiador’; ora tal como já mencionei num dos parágrafos anteriores, é mais fácil simpatizar com a personagem do General Maximus, porquê? Em primeiro lugar porque a ideia que o homem transmite é de que é bom naquilo que faz. É um homem que ganhou o respeito dos seus homens através das batalhas que comandou, é um homem que apesar de estar longe é dedicado à sua família. É um homem que ganhou o respeito do Imperador romano, de tal forma que este antevendo a sua morte e não querendo que o poder caísse nas mãos do seu filho, preferiu incumbir o seu General da tarefa de passar o poder para o Senado e este é o motivo pelo qual o nosso intrépido General cai em desgraça quando o filho do Imperador mata o próprio pai. O.K, vamos parar um pouco nesta parte. Quais poderão ser os efeitos que esta ideia tem nos portuguesinhos?

Logo para começar, o pessoal adora a ideia de poder distinguir aqueles que são bons daqueles que são maus. O General pertence à categoria dos bonzinhos, o filho do Imperador pertence à categoria dos pérfidos malvados, ou seja dos vilões. De seguida, o mais comum dos mortais identifica-se, bem ou mal, com o percurso de vida do General. Todos querem ser bonzinhos, gostam de ser reconhecidos pelo seu trabalho, gostam de defender os ideais de família, gostam de conquistar o reconhecimento por parte dos seus superiores e também caem em desgraça quando são traídos.

Continuando com a versão cinematográfica, o nosso General cai em desgraça e a vida corre-lhe muito mal a partir daí. Fica sem casa, sem família e ainda por cima é vendido como escravo. Mas eis que é aí que começa o seu novo percurso ascendente. De escravo passa a Gladiador e aos poucos (e outra vez à pala do seu trabalho), começa a recuperar poder. Este poder nunca será igual ao que tinha tido antes, mas serve perfeitamente para cumprir os objectivos que lhe tinham sido traçados e serve perfeitamente para arrumar o pérfido filho do Imperador.

Ora, transportando isto para o perfil dos portugueses chegamos à conclusão que todos fazemos o mesmo quando caímos em desgraça. Todos tentamos sobreviver e quando nos podemos vingar de quem nos fez mal, apelamos muito mais a Nietzsche do que aos princípios cristãos de amor ao próximo. Ou seja, o nosso intrépido General Romano apela à dimensão humana naquilo que ela tem de mais comum aos homens e por isso torna-se mais fácil de simpatizar com a personagem.

Passemos agora ao ‘Alexandre’. Tal como, também, já mencionei atrás não é nada fácil estabelecer uma empatia com esta personagem. O Alexandre, ainda que historicamente tenha sido um grande homem na sua época, na versão cinematográfica é apresentado como um homem frágil e torturado desde a sua infância, quer pela figura da mãe que tem um peso brutal na construção da sua personalidade, quer pela figura do pai que na maior parte das vezes se pode considerar como ausente. Nele, reflecte-se a vivência conflituosa dos seus progenitores e nos seus ombros cai, posteriormente, o peso da morte do pai sob a figura da suspeição que ele tem sobre se foi a mãe que o mandou assassinar ou não. A forma como este homem adquire o poder está rodeada de um mistério que nunca vai ser resolvido até ao fim da sua vida. E assim temos uma personagem com graves problemas de identidade que não sabe, se o poder que lhe caiu nas mãos caiu porque era esse o seu desejo, ou antes pelo contrário se esse era o desejo da sua mãe.

Então agora vamos ver como é que isto se poderá encaixar no perfil dos portugueses. Bom, para começar temos um tipo sobre o qual cai, repentinamente, o poder (ring any bells??). O problema disto é que o pessoal não curte nada estas cenas, logo porque em primeiro lugar não percebe como é que, assim de um momento para o outro, uma determinada figura adquire tanto poder. Parecendo que não, isto será sempre uma espada que pende sobre a cabeça do governante independentemente das acções que este possa tomar no futuro. De seguida ainda há outro handicap. É que as pessoas têm pena de mentes torturadas e com infâncias infelizes, mas daí até quererem ser governados por elas vai uma longa distância.

O.K, mas continuando no nosso périplo cinematográfico. Então o nosso pequeno Alexandre chega ao poder e como chega, também, à conclusão de que a Macedónia constituía um Lebensraum muito restritivo (até porque estava constantemente debaixo da alçada da mãe), toca de expandir os horizontes ou seja, fronteiras. E lá vai ele com o seu séquito, fundando Alexandrias por todo o sítio que passa e cultivando uma amizade cada vez mais profunda com o seu amigo de longa data, Hefaístos (note-se que este tipo de amizade profunda e avassaladora, era algo também muito comum entre os comandantes do seu exército). A partir de uma determinada altura, aquilo que até pareciam uns objectivos relativamente racionais, transformam-se numa ambição desmedida. As comadres zangam-se e os tipos levam uma coça dos diabos ali para os lados da Índia. A partir daí o pequeno Alexandre enceta o seu percurso descendente.

Voltemos então ao perfil dos portugueses. Em primeiro lugar, o pessoal acha esta história do Lebensraum uma grandessíssima tanga. Aquilo que temos chega perfeitamente e mesmo assim já nos dá um trabalho dos diabos porque nem sabemos como o havemos de gerir. Em segundo lugar, colocar o seu nome por todo o lugar onde se passa faz lembrar a praga dos grafitis, onde houver uma parede branca haverá um atrasado mental com um spray na mão sempre pronto a lá colocar o nome. O narcisismo tem os seus limites e o pessoal não embarca muito nisto. Em terceiro lugar, cultivar amizades com aquele grau de profundidade também tem os seus limites. As pessoas são tolerantes, mas dentro dos limites da razoabilidade. E em quarto lugar, quando o exercício do poder se transforma num exercício de uma ambição desmedida, as pessoas tendem a não gostar e a insurgir-se contra, desta forma passa-se consequentemente à fase da coça.

Finalmente, dadas estas explicações, penso que já todos perceberam porque motivos não se devem escolher Bandas Sonoras para Campanhas eleitorais. A música até pode ser muito engraçada e muito épica, mas vai despoletar uma série de associações na cabeça das pessoas que, se nalguns casos podem ter efeitos positivos, noutros podem ter efeitos negativos uma vez que todas estão associadas a histórias de determinadas personagens, às quais o público reage emocionalmente. Daí que seria muito mais útil criar a sua própria banda sonora, criar a sua própria identidade, não usurpando a identidade dos outros.

3 comentários:

BSC disse...

Anthrax, na mouche, como sempre!

Adorei a parte do 'Alexandre' abichanado... a mim não me espanta muito!

O k poderíamos esperar daquele PS????

Anthrax disse...

Cara amiga Somelikeithot,

Obrigado pelas suas palavras. O problema, é que quem ficou com a música do 'Alexandre o Grande', foi o PSD.

Anthrax disse...

Caro Eu sei,

Pois que não há raum que aguente também eu sei! Que o digam os alemães que foi assim que perderam a Guerra. ;)