segunda-feira, outubro 17, 2005

MODERNIDADES LINGUÍSTICAS

Desde que os americanos se lembraram de começar a chamar "afro-americanos" aos pretos, com vista a acabar com as raças por via gramatical - isto tem sido um fartote pegado!

As criadas dos anos 70 passaram a "empregadas" e preparam-se agora para receber men
ção de "auxiliares de apoio doméstico".

De igual modo, extinguiram-se nas escolas os "cont
ínuos"; passaram todos a "auxiliares da acção educativa".

Os vendedores de medicamentos, inchados de pros
ápia, tratam-se de "delegados de informação médica".

E pelo mesmo processo transmudaram-se os caixeiros-viajantes em "t
écnicos de vendas".

Os drogados transformaram-se em "toxicodependentes" (como se os consumos de cerveja e de coca
ína se equivalessem!);

O aborto eufemizou-se em "interrup
ção voluntária da gravidez";

Os gangues são "grupos de jovens";

Os operários fizeram-se de repente "colaboradores"; e as fábricas, essas, vistas de dentro são "unidades produtivas" e vistas da estranja são "centros de decisão nacionais".

O analfabetismo desapareceu da crosta portuguesa, cedendo o passo à "iliteracia" galopante.

Desapareceram outrossim dos comboios as classes 1.
ª e 2.ª, para não ferir a susceptibilidade social das massas hierarquizadas, mas por imperscrutáveis necessidades de tesouraria continuam a cobrar-se preços distintos nas classes "Conforto" e "Turística".

A
Ágata, rainha do pimba, cantava chorosa: «Sou mãe solteira...»;
Agora, se quiser acompanhar os novos tempos, deve alterar a letra da pungente melodia:
«Tenho uma família monoparental...»

Aquietadas pela televis
ão, já se não vêem por aí aos pinotes crianças irrequietas e «terroristas»; diz-se modernamente que têm um "comportamento disfuncional hiperactivo".

Do mesmo modo, e para felicidade dos "encarregados de educa
ção", os brilhantes programas escolares
extinguiram os alunos c
ábulas; tais estudantes serão, quando muito, "crianças de desenvolvimento instável".

Ainda h
á cegos, infelizmente, como nota na sua crónica o Eurico. Mas como a palavra fosse considerada desagradável e até aviltante, quem não vê é considerado "invisual". (O termo é gramaticalmente impróprio, como impróprio seria chamar inauditivos aos surdos - mas o "politicamente correcto" marimba-se para as regras gramaticais...)

Para compor o ramalhete e se darem ares, as gentes cultas da pra
ça desbocam-se em "implementações", "posturas pró-activas", "políticas fracturantes" e outros barbarismos da linguagem.

E assim linguajamos o Português, vagueando perdidos entre a «correcção política» e o novo-riquismo linguístico.


5 comentários:

Lose Weight disse...
Este comentário foi removido por um gestor do blogue.
crack disse...

Meu querido amigo Anthrax
Quando for grande posso tentar parecer-me consigo? Só um bocadinho?
:))

Anthrax disse...

Ah ah ah ah :)) Brincalhão.

Ana M. disse...

Ora,ora, não é que ficaram logo
de fora as "profissionais do
sexo"?
Esquecimento tanto mais grave,
quanto diz respeito ao trabalho de algumas mães de uns tantos políticos da nossa Praça.

Um abraço.

Anthrax disse...

Cara(o) Sininho,

Ficaram de fora as "profissionais do sexo", porque não ia pôr palavrões no meu blog.

No que respeita à actividade profissional das progenitoras de alguns políticos da nossa praça, vivemos numa democracia. Cada um tem o direito de escolher a carreira que muito bem entender, seja ela qual for. E as regras da convivência em sociedade passam pelo respeito pelas escolhas dos Outros.

Um abraço para si também e volte sempre.