quarta-feira, fevereiro 21, 2007

TÁCTICAS DE PROTESTO (III)

Ok, ora então estávamos na parte dos protestos menos pacíficos (e daí a alusão ao Black Bloc), que normalmente envolvem a destruição efectiva de coisas (e.g. lojas e tudo o que aparecer pela frente e que seja um símbolo do capitalismo e um hino ao consumo). Esta é, de facto, uma via extrema que se pode observar sempre que há reuniões do G8.

Ao contrário do que se pode pensar, estas manifestações além de nunca serem pacíficas são concebidas com o propósito mediático de tirarem vantagem da brutalidade polícial. E isto funciona, o que significa também que os organizadores são, altamente, profissionais e devem ser respeitados por isso.

Como diria o meu professor de "Gestão da Inovação", «É muito simples amonitar um hipermercado desde que se aproveitem todas as condições que nos são oferecidas». Nunca experimentei a fazer isso mas, um dia destes experimento a fazê-lo num supermercado visto que é mais pequeno. Uma das coisas que funciona bem (e que normalmente é o início da coisa), é começar por destabelizar as hostes. Como?

Imaginem um supermercado de bairro, ao fim do dia, as pessoas estão cansadas depois do trabalho, as caixas não estão todas abertas (porque isso implicaria + pessoal e + pessoal implicaria + dinheiro), as filas são jeitosas, a moça da caixa mesmo fazendo o que pode não se despacha tão depressa como nós gostaríamos, está calor porque muita gente junta faz com esse seja o resultado, a criancinha da tipa que está à nossa frente entra numa crise de histeria porque a mãe não lhe quer comprar um chupa, e nós - paulatinamente - começamos, primeiro a bufar por todos os lados, depois a refilar sózinhos num tom de voz audível mas não necessariamente alto, depois a velhota que está atrás de nós mete-se na conversa e começa a refilar também aumentando o volume mais um bocadinho e em menos de cinco minutos tem-se todas as pessoas que estiverem naquelas filas em estado de agitação. Uns porque criam uma empatia com quem refila e acham que está coberto de razão, outros porque não criam uma empatia com quem refila mas também não podem sair da fila.

Nota: este cenário também funciona aos fins de semana desde que perto das horas das refeições. Porquê? Porque a fome predispõe à irritação, o indíviduo fica vulnerável e susceptível de refilar por tudo e por nada.

É claro que este tipo de coisas é engraçado quando se quer ver se funciona e quando se pretende que seja uma experiência, mais ou menos, controlada (sim, porque também há que contar com o acaso). No entanto, a verdade é que a utilidade destas coisas é bastante mais transversal e pode ser aplicada a uma massa de pessoas, tudo depende do organizador e de até onde se está disposto a ir para passar a mensagem.

Por exemplo, na minha óptica, a manifestação mais bem organizada contra o encerramento das urgências foi a de Valença. As outras contra o encerramento das maternidades e de outras urgências foram um verdadeiro fiasco porque não tiveram a visibilidade que deviam ter tido. Quando as pessoas se manifestam há que ter a certeza que se fazem ouvir e para se fazerem ouvir têm fazer algo mediático. A verdade é que, o que se está a passar aqui se estivesse a passar em França, o mais provável é que já estivesse tudo a ferro e fogo. Mas não, estamos em Portugal e não queremos dar-nos ao trabalho, por isso o governo vai fechando maternidades e urgências e o povo fica tranquilo. Para quê confusões quando eles vão fechar aquela porcaria na mesma?

Eu respondo-vos. É claro que fecham aquela porcaria na mesma, vocês não se fazem ouvir por isso também não podem ser levados a sério. Estrebucham um bocado mas depois passa, além disso quem é que vai ligar a meia dúzia de gatos pingados que moram onde judas perdeu as botas?

Façam qualquer coisa que faça a abertura dos noticiários e apareça nas primeiras páginas dos jornais e passam a ter toda a atenção.

É claro que quando se organizam estas coisas, tem de haver planeamento e deve-se contar sempre com a presença polícial (até porque se eles não estiverem presentes é porque o evento não é importante). Os «bófias» fazem parte integrante destas coisas porque têm de fazer. É o trabalho deles e normalmente levam os seus colegas de quatro patas, faz parte do arraial e das tácticas de controlo de multidões. Da mesma maneira que faz parte do arraial chamar-lhes «Porcos Fascistas» e chamar nomes às mães deles. A questão aqui é arranjar qualquer coisa que seja nova e - de preferência - que fique bem na televisão (porque se forem só uma nota de rodapé é meio caminho para o desastre).

Apitos de ultra sons funcionam muito bem com animais, principalmente, se forem muitos (apitos). Mascararem-se todos de coelhinhos também é capaz de não funcionar mal (principalmente, porque em caso de carga policial o que vai acontecer é que quando aparecer na televisão aquilo que a audiência vai ver são uma data de policias a bater em coelhinhos e os coelhinhos são sempre vítimas). Lembrem-se também que, da parte dos polícias há tácticas para prender, o que significa que da parte dos manifestantes tem de haver tácticas para "desprender" ( atenção que estas existem mesmo). Nos meios rurais há uma variedade imensa de produtos que podem ser utilizados para aborrecer as forças de segurança, nomeadamente, bosta, estrume etc. Não mata mas, de certeza que mói.

Outra coisa a ter em consideração quando se organiza uma manifestação, assim mais a sério, é o local. Para quê manifestarem-se á porta dos hospitais e centros de saúde? Assim como assim vão fechar e as pessoas que lá estão não podem fazer nada! O melhor é escolher locais mais adequados do que atrás do sol posto (não se esqueçam que a Av. da Liberdade em Lisboa tem muito espaço) e contactar outros distritos que tenham o mesmo problema porque é mais engraçado manifestarem-se todos ao mesmo tempo do que um de cada vez.

Também se pode dar o caso da manifestação ser proíbida. E então? Para que é que serve a desobediência civil? A desobediência civil é um acto de cidadania, de participação política activa e está previsto no Artº 21 da CRP.

Bom, por agora vou ficar por aqui. No próximo concluo.

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