terça-feira, junho 15, 2004

UMA AVENTURA NOS TRIBUNAIS PORTUGUESES

A pedido de várias famílias... bom, várias não. Algumas (que isto é um diário muito selecto e eu não atendo os pedidos de qualquer um). Mas como eu estava a dizer, a pedido de várias-algumas, famílias conto-vos hoje a minha primeira experiência num tribunal português.

No passado dia 8 de Junho, era eu uma pacata testemunha num processo que uma amiga colocou contra a EPUL (sim, essa mesmo). Ora não sendo eu advogado (talvez devesse, levo jeito para a coisa), devo confessar que apesar dos poucos conhecimentos que tenho de Direito (não se riam, são poucos mesmo, o resto é um mero exercício de lógica), acreditava que este era um caso que tinha tudo para ganhar. O réu - a EPUL - tinha um letreiro luminoso que piscava e dizia «Culpado», logo à partida um processo bem gerido estava ganho.

A audiência estava marcada para as 10:00 naquele edifício - de arquitectura do Estado-novo - que fica no alto do Parque Eduardo VII. Obcecado com as horas (eu e o coelhinho da Alice no País das Maravilhas), cheguei às 08:45 que era para ter a certeza que não era surpreendido pelo trânsito, nem me atrasava. Claro está que às 09:30 já sentia como um bacalhau ao sol, ou seja, a secar. Mas adiante, entretanto foram chegando o resto dos convivas e os malvados da empresa de construção civil acusada, acompanhados pela sua advogada (que diga-se tinha pouco mais de meio metro, mas nestas coisas as mulheres não se medem aos palmos). O advogado da autora (a minha amiga), chegou atrasado mas como é manco de uma perna, conversa vem, conversa vai e acaba tudo desculpado até porque a capacidade de argumentação da criatura não depende da fragilidade da sua condição física (pensávamos nós em boa-fé).

Acordo entre as partes, não houve. Aliás, convido qualquer pessoa particular a tentar negociar com uma empresa de construção civil e verificar se consegue ser bem sucedido, sem sentir que está a ser grandemente «entalado». Se existir alguém assim, por favor contactem-me que eu quero ouvir e disseminar tamanha proeza. Mas continuando, não houve acordo entre as partes, pois a proposta era - no mínimo - hilariante. E o processo seguiu para julgamento. E aqui é que a porca torceu o rabo.

A juíza pareceu-me uma mulher inteligente (deve ser por isso que chegou a juíza), e o advogado manco pareceu-me completamente descompensado e incompetente. Após as perguntas da juíza, começou a criatura a interrogar-me. Coitado, o homem foi acometido de loucura súbita, pensei eu. Como sou um optimista por natureza, pensei que o melhor era definir à partida o âmbito da resposta, porque a escola que aquela criatura frequentou, eu também frequentei e a única variação entre nós foi o tema do curso. Depois houve aqueles que aprenderam alguma coisa e outros nem por isso (categoria cuja qual se enquadra a criatura). A esta altura a advogada da EPUL sorria (pois eu também sorriria, porque com um advogado daqueles a gerir aquele processo, a empresa nem precisava de ter levado advogada). Quando aquela mente empobrecida e pouco articulada me coloca uma pergunta sobre um valor relacionado com um arrendamento, estive vai não vai para lhe dizer que não era eu que pagava as contas (confesso que essa resposta esteve mesmo na pontinha da minha língua pronta para saír), mas depois concluí que aquilo não era uma resposta apropriada para um tribunal e acabei por florear um pouco a coisa. Conclusão a advogada da EPUL, não me colocou uma única pergunta.

Quando cheguei cá fora, duas das testemunhas que tinham entrado antes de mim estavam possessas com uma séria vontade de pôr o advogado, manco da outra perna. Não me opus à ideia, mas alertei-os para o facto de que isso não podia ser feito mesmo nas barbas do tribunal. Era preferível um beco escuro e pouco frequentado. Mais tarde vim a saber que às testemunhas que seguiram, o cretino começou a fazer perguntas sobre taxas de juro. Não sei estão a ver (não, eu sei que não estão), mas fazer perguntas sobre taxas de juro a testemunhas que não percebem «um boi» do assunto, é candidatar-se seriamente a um curso de queda-livre, sem o bónus do paraquedas.

Bom, conclusão: Um caso que tinha tudo para ganhar veio por água abaixo por incúria do advogado (ao qual ainda vão ter de pagar honorários claro está). A falta de articulação entre as questões colocadas era gritante, a incapacidade de conduzir as testemunhas a uma resposta satisfatória foi brutal e eu até não me posso queixar, porque no fundo quem conduziu o meu interrogatório fui eu. Agora isto foi porque estranhei aquela conduta e apercebi-me que a coisa estava a descambar, e já que o advogado se demonstrava incapaz de segurar nas rédeas enquanto lá estive em frente à juíza, ao menos que houvesse alguém que as segurasse, mesmo que esse alguém fosse eu.

No meio disto tudo, e ainda que este caso não seja um daqueles altamente decisivos na vida de uma pessoa, não posso deixar de me preocupar. Porque eu, por acaso - um raro momento de inspiração quiçá - reagi de forma inteligente. Mas a verdade é que naquele preciso momento, não era eu que tinha de ser inteligente. Eu só deveria ter que responder ás perguntas que me eram colocadas. E estas é que deveriam ter obedecido a uma ordem inteligente. Agora aquilo que pergunto é: Se isto acontece com casos simples, então o que é que acontece em situações mais graves? E não, não vou falar mal dos advogados porque esta foi apenas uma primeira experiência que por acaso (espero eu), correu mal e somente por este motivo não vou generalizar os 'atributos' de um individuo em particular a uma classe em geral. Mas ainda assim não deixa de ser preocupante.

E esta foi a minha primeira aventura numa sala de tribunal.

1 comentário:

crack disse...

Este vai para a minha colecção!
Posso dar uma de MRS e atribuir 40 valores?
:)))