segunda-feira, abril 30, 2007

OS HOBBITS E A DISPOSIÇÃO CONSERVADORA DE OAKESHOTT (II)

(cont.)
A estrutura social e política do Shire.


Enquanto autor de um género literário fantástico, a obra de Tolkien distingue-se pelo elevado grau de realismo que imprime ao mundo que criou. A criação do mundo que Tolkien designa por Terra Média (Middle Earth), é desenvolvida ao longo de 60 anos e aqui o autor cria, não só, as línguas, características das várias raças que habitam o seu universo, como também, cria os contextos sócio-culturais em que estas se desenvolvem e evoluem. Assim, um dos aspectos desse realismo é a percepção de como estas sociedades imaginárias se organizam e funcionam.


De acordo com W.H Stoddart, num ensaio entitulado “Social and Political structure in the Shire as portrayed in the Hobbit and the Lord of the Rings and related works by JRR Tolkien”, em termos antropológicos o Shire encontra-se num processo de transição entre duas formas de organização social e política - o clã e o Estado.


O Clã, no sentido de um grau de organização familiar composto por pequenos distritos municipais, liderados pelos chefes de família. O Estado, no sentido de um grau de organização que se reflecte ao nível de todo o Shire pela presença de um governo civil (civil government), responsável pela manutenção e segurança das suas fronteiras.


Ao cargo de Shirrif, pertence a responsabilidade de assegurar as comunicações e ao cargo de Postmaster, cabe a responsabilidade de assegurar a boa manutenção de uma economia de mercado.


Finalmente, à frente deste governo civil está um Mayor, eleito por sufrágio e para mandatos de 7 anos (Nota: Não encontrei qualquer referência quanto ao tipo de sufrágio).


Ainda que à partida, o Shire se assemelhe a um enclave Republicano num mundo de Reis e Rainhas, nominalmente, o Shire reconhecia a autoridade do Monarca, dos reinos de Gondor e Arnor, que lhes havia concedido a terra. Contudo, com o passar das gerações, os contactos com estes dois reinos foram esquecidos e os Hobbits também nunca sentiram grande inclinação para designar o seu próprio Rei, nem muito menos para embarcar em grandes aventuras colectivas, excepto em circunstâncias ocasionais de guerra defensiva.


No que respeita à estrutura social, todos os Hobbits eram lentos em mudar mas, o povo do Shire, em 1400 anos, já havia desenvolvido uma vida social estável e elaborada na qual a importância da afinidade para com os seus sentimentos e costumes havia sido auxiliada por tradições detalhadas, quer escritas, quer verbais.


Como referido anteriormente, o território concedido por Gondor e Arnor foi organizado socialmente sob a forma de clãs á semelhança do que acontece, por exemplo, na tradição celta. Tal como é referido na carta n.º 183 de Tolkien, este é um sistema arcaico, baseado nas terras das famílias e em que estas se reúnem em torno de um indivíduo, normalmente, identificado com o Chefe de família. Este tem funções de liderança, poucos poderes de coerção mas, detentor de uma grande influência por meio do prestígio e da riqueza. Para além disso, e como o autor refere posteriormente, na carta 214 sobre o “Costume dos Hobbits”, estes eram universalmente monogâmicos (raramente se casavam uma segunda vez, mesmo se a esposa ou o marido falecessem muito jovens).


Os arranjos familiares eram patrilineares. Quer dizer, os nomes de família descendiam na linha masculina (e as mulheres adoptavam os nomes dos seus maridos); também o chefe titular da família era, normalmente, o homem mais velho. No caso de famílias grandes e poderosas, estas permaneciam unidas mesmo quando eram numerosas e o chefe era, formalmente, o homem mais velho.


(To be continued...)

3 comentários:

Great Houdini disse...

Aí está um homem de convições ... Já não muitos por aí, mas confesso-me curioso como irá acabar esta analogia.

Um dia destes tem de fazer um quadro resumo, pois a informação começa a ser substancial e ainda por cima no fim está sempre a espreitar o continuará :)

Boa dissertação.

Anthrax disse...

Pois que acaba na parte em que digo "The end".

Não faltará muito, digo eu, mas ainda tenho que ir re-ler o Oakeshott. :)

CHEVALIER DE PAS disse...

nessa história há uma parte que me preocupa, deveras, é a do governo civil, tenho que ir preparando o espírito!