terça-feira, junho 12, 2007

E AGORA, A RESPECTIVA RESPOSTA À CITAÇÃO

Nota: Depois de ter recebido a referida citação por e-mail, um amigo meu - cidadão honesto e acima de tudo preocupado - solicitou a minha ajuda para escrever uma resposta apropriada à Administração Fiscal.
Bom, como dar respostas apropriadas começa a ser uma especialidade da minha pessoa, fui incapaz de recusar tal pedido. Assim sendo, eis a resposta à referida citação que seguiu hoje por carta (tenham paciência, é um pouco longa mas vale a pena ler).
-----------------------------------------------------------------------
«Exmo. Sr.
SubDirector-Geral da Justiça Tributária
Dr. Alberto Augusto Pedroso,

Relativamente ao seu e-mail, datado de 9 de Junho de 2007, sobre a execução fiscal instaurada para a cobrança coerciva da dívida tributária sobre a empresa IDENTIFICAÇÃO DA EMPRESA(NIF), venho por este meio agradecer desde já a v/ prontidão em esclarecer o conjunto de actos de coerção, levados a cabo pela Direcção-Geral dos Impostos (DGCI), inerentes à Lei Geral Tributária e ao Código de Procedimento e de Processo Tributário e aproveito a oportunidade para me colocar ao vosso dispôr no sentido de solucionar a questão de uma forma tão breve quanto possível.

Assim sendo, e numa tentativa de vos poupar algum trabalho, embora não pretenda – de forma alguma – substituir-me às tarefas dos vossos funcionários ou que os mesmos vão parar ao quadro de excedentários, supranumerários ou outro qualquer quadro da Administração Pública que se lembrem de criar entretanto para despachar mais alguns, importa escrever algumas palavras sobre as cinco acções coercivas da competência da vossa Direcção Geral:

1.º A penhora em bens e direitos do seu património;

É com algum pesar que vos informo que a empresa, IDENTIFICAÇÃO DA EMPRESA (NIF), nunca teve qualquer actividade. Para mim é aborrecido porque o projecto não foi, infelizmente, bem sucedido, no entanto, para V.exas deve ser dramático porque não conseguem extorquir nenhum tostão para colocarem no v/ porquinho mealheiro.

A empresa não tem bens, não tem património e se alguma vez teve algum direito devia estar muito escondido visto que nunca o encontrei. Em compensação, encontrei muitos deveres como, aliás, muitas outras PME em Portugal deverão ter encontrado e aos quais, estou certo, que os senhores não são alheios graças ao vosso estilo predatório encorajado pelos sucessivos governos nestes últimos anos. Têm muitas bocas para alimentar não é verdade? Pois eu também tenho e advinhem lá uma coisa? Não posso.

2.º A marcação da venda de bens móveis e imóveis penhorados que a exijam para, com o seu produto, se efectuar o pagamento da dívida;

Se nas vossas pesquisas encontrarem algum bem móvel ou imóvel para vender, garanto-vos que vos apoiarei em tudo quanto me for possível pois ninguém tem um interesse maior do que o meu em resolver toda esta situação. Excepto os vossos Serviços, é claro, sustentar um Estado velho e pesado que precisa de injecções, constantemente, não só não é uma tarefa fácil como também é ingrata. Afinal, é muito mais simples tributar presumíveis rendimentos futuros dos pequenos, do que dos grandes, até porque a dentada destes últimos dói muito mais do que a dos pequenitos. É compreensível, são outros interesses. Mas, já consideraram a hipótese de tributar aos bancos aquilo que tributam às pequenas e médias empresas? É que eles devem ser das únicas organizações a ter lucro quando todos os outros têm prejuízo... Ah, é verdade! É claro que já consideraram a hipótese, caso contrário eles não estariam isentos de pagar aquilo que todos os outros têm de pagar independentemente de terem actividade ou não.

3.º O cancelamento ou suspensão de todos os benefícios fiscais que está a usufruir ou que venha a invocar, enquanto se mantiver a situação devedora;

Meus caros senhores, confesso que por breves instantes cheguei a pensar que existiam benefícios fiscais para alguém e fiquei confuso mas, creio que este lapso se terá ficado a dever à construção da frase. Estou certo que para os técnicos, que trabalham com estes conceitos todos os dias, a escolha das palavras e a respectiva construção frásica fará todo o sentido mas, se me permitirem uma sugestão, deveriam escrever qualquer coisa como “A suspensão ou cancelamento dos benefícios fiscais, que está a usufruir ou que venha a solicitar, enquanto se mantiver a situação devedora”. Perceber-se-ia, ligeiramente, melhor e seriam escusadas algumas redundâncias. Além do mais, não me parece que os benefícios fiscais sejam algo que se possa invocar.

Após a apresentação desta pequena sugestão, parece-me um pouco exótico que uma empresa que não tem actividade, nem nunca passou do papel, usufrua ou venha a usufruír de algum benefício fiscal passível de ser suspenso ou cancelado mas estou certo, que como qualquer outro cidadão de bem, poderei contar sempre com a criatividade inerente aos vossos serviços.

4.º O cancelamento automático de reembolsos ou restituições de impostos, que serão canalizados em montante suficiente para o pagamento das dívidas;

Ora aqui está um ponto interessante. Afinal, em Portugal é possível receber reembolsos ou restituições de impostos em dívida, pois só assim se justifica que se possa proceder ao cancelamento automático de reembolsos ou restituições. Caso contrário, num país normal, este acto seria considerado, um tanto ou quanto, inócuo senão mesmo absurdo. Poderia dizer que compreendia mas, na realidade, não estaria a ser sincero e aqui já não se trata de uma questão de sintaxe mas de conteúdo. Ora, uma empresa sem actividade, cujos rendimentos são zero e que é tributada não pelos rendimentos que apresenta mas pelos rendimentos que a Administração fiscal presume (duas vezes ou mais) que apresenta, realmente, só poderia ter direito a uma restituição ou um reembolso presumido pela Administração fiscal. Por outras palavras, como estamos no mundo das presunções, é tudo uma grande ficção elaborada por génios altamente qualificados que se dedicam à arte de presumir. Uma espécie de faz de conta, no qual se presume que as empresas são um género de pequenos bancos que adiantam dinheiro ao estado e cuja única parte real é aquela em que, efectivamente, se tem de pagar os delírios dos que passam o seu tempo a presumir.

5.º A integração do seu nome na lista de devedores que está publicitada na Internet.

Finalmente, folgo em saber que existe uma instituição estatal que faz publicidade gratuita. Em boa verdade tenho de confessar que, considerando ao preço a que está a publicidade, o fornecimento desse serviço deve ser encorajado. Se puderem colocar os logotipos e os números de contacto ainda era melhor e faziam concorrência directa às páginas amarelas. Em relação a isto, apenas lamento que não publicitem também os diversos serviços do estado que têm dívidas para com as empresas e que identifiquem os respectivos montantes em divida. Estou certo que, no global, seria um exercício elucidativo e útil no que respeita ao apuramento das contas. Talvez, um dia destes, se faça esse levantamento e se publique também uma lista já que parece que a criação de listas está tão na moda e a sociedade de informação é uma das prioridades do actual governo.

Para concluir, uma vez que não pretendo tornar-me maçador com toda esta história, reitero toda a minha disponibilidade em cooperar com os vossos serviços no sentido de saldar a dívida à Administração fiscal. Deixo-vos, todavia, mais uma nota final. Tenho quarenta anos, sou licenciado, pós-graduado e actualmente mestrando (à falta de trabalho, ao menos continua-se a estudar). Estou desempregado à sete anos, nunca recebi subsídio de desemprego, nem nunca recebi qualquer outro tipo de apoio do estado. Estou inscrito no Instituto de Emprego e Formação Profissional mas não serve para, rigorosamente, nada. Não tenho rendimentos e não tenho bens, nem móveis, nem imóveis. Em suma, não tenho absolutamente nada mas, ainda assim, estou disposto a ajudar no que for possível para resolver esta situação. Por isso, se V.Exas. querem que eu pague a divída à Administração fiscal, eu também quero pagar, para isso basta apenas que me arranjem um emprego no qual eu possa auferir de um salário que me permita pagar-vos ou então, que arrangem um serviço que a empresa IDENTIFICAÇÃO DA EMPRESA (NIF) eventualmente possa prestar, por forma a realizar algum rendimento que me permita saldar o montante em dívida. Para qualquer resposta, podem sempre utilizar o endereço de e-mail que consta do website da DGCI, assim é muito mais económico.

Sem outro assunto de momento, despeço-me com toda a consideração.


Atenciosamente,
X »

2 comentários:

Virus disse...

Eu cá juntava-lhe farinha dentro do envelope...

E quando viesse a PIDE... digo a Policia para o prender por atentado terrorista com farinha alegava que estava a fazer um bolo quando meti a carta dentro do envelope.

Anthrax disse...

Ah ah ah ah!! :))

Não me lembrei dessa. Até teria sido engraçado. :) Fica para a próxima.